
Muito se tem dito e escrito sobre o divórcio entre o cidadão comum e os políticos, entre a sociedade civil e as instituições de um regime que um dia se quis democrático.
Da esquerda à direita, independentemente da perspectiva que se adopte para abordar o fenómeno do relacionamento do cidadão com a política e da postura dos políticos face aos cidadãos, o certo é que ninguém que preze a sua honestidade intelectual pode aplaudir o actual estado de coisas.
Tudo o que na política era sério, digno, nobre e capaz de mobilizar pessoas e aglutinar ideais, foi literalmente dilacerado por um comportamento mercantilista da generalidade da classe política, que prostituiu a política em nome das ambições e vaidades privadas, dos interesses partidários ou de grupos económicos.
À frontalidade sobrepôs-se a hipocrisia. A coragem depressa foi vencida pela cobardia. A inteligência vendida à cegueira dos cargos, do poder e das honrarias. Os políticos perderam fulgor, especializaram-se em fugir aos desafios, em negar as evidências e a dar o dito pelo não dito.
Depressa se chegou a uma situação assustadora em que por ignorância, por comodismo ou por incapacidade, a sociedade transferiu para a classe política o poder de modelar a democracia, de defender os seus valores intrínsecos, de representar e de dar voz aos seus mais legítimos anseios, e aquela, na sua maioria, destituída de cultura e de civilidade, baralhou e confundiu os direitos e os deveres dos representantes e dos representados, falando e agindo em nome destes, usurpando poderes e viciando as verdadeiras regras do jogo democrático.
Com tudo isto, Portugal transformou-se num país em que o que conta são algumas centenas de políticos, meia dúzia de grupos económicos, três canais de televisão de grande audiência, três clubes de futebol e milhões de cidadãos desmotivados, cépticos e incrédulos.
Sendo a política a profissão mais antiga do mundo, mais antiga do que aquela que todos pensam ser, o certo é que nos últimos tempos a classe política portuguesa tem
feito tudo para demonstrar que se a política vence a prostituição em antiguidade, não o faz em honestidade.
Assim sendo, quem pode acreditar em novas eras? Quem está disposto a confiar em novas promessas vindas do tradicional poder estabelecido? Não valerá a pena começar a considerar outras alternativas? Não valerá a pena atribuir algum crédito a outras vozes?
Não será proveitoso incentivar o aparecimento de outras correntes de pensamento?
Perante tantas dúvidas legítimas, a única certeza é a de que o presente que vivemos não garante o futuro, nem é digno de ser herdado pelas novas gerações. A mudança é necessária como única forma de salvaguardar a democracia. Haja coragem para a fazer.
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